Divulgação científica depende do inglês

O mundo vive um período de intensa globalização, marcado principalmente pela conexão cultural e científica. Nesse contexto, a língua inglesa destaca-se como o principal idioma na disseminação de conhecimento e informações. Em 2020, segundo a Organização de Estados Ibero-Americanos (OEI), a maioria dos pesquisadores (84%) optou por publicar em inglês na plataforma WoS (Web of Science), em vez de usar suas línguas nativas. Apenas 3% dos pesquisadores portugueses e 12% dos brasileiros optaram por publicar na língua portuguesa.

O inglês virou a língua da ciência e isso facilita a comunicação, mas também cria obstáculos para quem não o domina. Os melhores cursos de inglês podem preparar o aluno para a pesquisa acadêmica, porém a dominância da língua na área científica é uma preocupação. O professor do Departamento de Sociologia e Comunicação da Universidade de Salamanca, Ángel Badillo, explica que a maior parte da população não tem acesso à ciência por estar em outro idioma. 

Em entrevista, Badillo diz que os artigos publicados em inglês não são o problema, mas sim a ausência de publicações em outras línguas. A barreira linguística pode ser um fator limitante que exclui muitos pesquisadores que não possuem fluência nesse idioma. Cria-se, assim, uma diferença no acesso ao conhecimento científico e consequentemente um atraso na evolução científica. 

Multilinguismo é a aposta dos cientistas

Em pesquisa publicada em 2023, a PLOS Biology revelou que os cientistas que não possuem fluência no inglês acabam enfrentando maiores desafios em suas carreiras. Isso acontece pois eles gastam mais tempo lendo publicações científicas e escrevendo suas próprias pesquisas. Além disso, a taxa de rejeição de empregos para pessoas não fluentes em inglês é 2,6 vezes maior. 

Pensando em tornar a ciência o menos excludente possível, os cientistas levantam opções como o multilinguismo. A Iniciativa de Helsinque sobre Multilinguismo na Comunicação Acadêmica, organizada pela Federação de Sociedades Científicas Finlandesas (TSV), é uma das defensoras dessa solução, que busca reconhecer e valorizar a diversidade de idiomas utilizados para comunicar os resultados de estudos e descobertas. A frase “É fundamental interagir com a sociedade e compartilhar conhecimento para além da academia” é destacada no site da iniciativa.

O multilinguismo não busca substituir o inglês como língua científica, mas sim enriquecer a divulgação científica e promover uma comunicação mais inclusiva e acessível em nível global. A pesquisadora do Conselho Nacional de Investigações Científicas e Técnicas (Conicet) da Argentina, María Fernanda Beigel, defende a promoção de políticas de tradução para promover mais revistas científicas multilíngues. “Isto dará uma oportunidade às publicações latino-americanas”, disse em evento da OEI. 

Um estudo publicado em março deste ano pela revista Nature indica que essa abordagem já é realidade na área de biodiversidade. Nesse campo, a maior parte das informações são divulgadas nos idiomas dos países de origem. Além disso, 75% das citações são provenientes de trabalhos escritos em línguas diferentes do inglês.

Cientistas precisam obrigatoriamente falar inglês? 

Muitos aspirantes a uma carreira científica podem se questionar se ainda é obrigatório falar inglês para entrar na área nos dias de hoje. Segundo o professor da Universidade de São Paulo (USP), Marco Mello, a resposta é afirmativa. “Todo cientista tem que saber ao menos ler em inglês. De preferência, um jovem cientista, que almeja se tornar um bom profissional, deve também aprender a escrever em inglês”, disse em artigo publicado em seu blog. 

A indicação de Marco nesse caso é investir em cursos de inglês online para aprender, além de apostar em apps e vivências no idioma. “Vale lembrar que, por pressão da pandemia de Covid-19, escolas de idiomas tradicionais também criaram excelentes versões remotas dos seus cursos presenciais”, diz.

O movimento de multilinguismo é forte, mas ainda não está plenamente difundido e muitos artigos acadêmicos vão estar disponíveis apenas na língua inglesa. Mello ressalta ainda que tradutores virtuais podem falhar em traduzir orações inteiras e textos mais complexos. Ele explica que, apesar de ser essencial, a barreira socioeconômica pode impedir que esses jovens consigam ter uma boa formação em outros idiomas. 

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Lucas W. Pelisari é escritor, formando em Investigação Forense e Perícia Criminal. Cursa Direito e atua profissionalmente no marketing. Sua especialidade é empreendedorismo e marketing digital.