Não aceite o lixo de ninguém

por Carmen Hornick (*)

Inicialmente, é preciso estabelecer, para este contexto, de que lixo estou falando. Por óbvio, não estou aqui a escrever sobre a possibilidade de o seu vizinho colocar o lixo na porta da sua casa. Eu não precisaria dizer para você rejeitá-lo. Você já sabe fazer isso, também sabe as razões que sustentam a sua decisão. Contudo, vou registrar aqui algumas delas: lixo cheira mal, atrai animais nocivos, como ratos; e insetos nojentos, como baratas. E, afinal, se você não o produziu, não há qualquer razão para que este seja depositado na sua porta, não é mesmo?

O lixo a que me refiro aqui não é o doméstico, nem o nuclear. Mas, os comportamentos agressivos com os quais nos deparamos nas nossas relações diárias cujo efeito é tão nefasto quanto o lixo em si na porta da nossa casa. Estamos por aí vivendo a vida e, de repente, os encontramos. Eles brotam, às vezes, até naqueles que amamos. Acontecem em qualquer lugar, na rua, no ônibus, no bar, na reunião de família, na escola ou no ambiente de trabalho. Enfim, não há como viver neste mundo sem encontrá-los, ao menos uma vez por semana. Parece que ficam ali, bem perto, e quando menos se espera, descarrega-se um caminhão de lixo lotado.

Sei que você sabe do que estou falando. Ainda assim, vamos ver se estamos na mesma página. Aposto que você, ao ler, lembrou do seu irmão, da vizinha da frente, do atendente do banco, do garçom, do seu colega de trabalho ou do seu chefe, não foi? Então, devo lhe dizer que, na verdade, estou falando de mim e de você.

Como assim? Isso mesmo, de mim e de você. Sempre há uma boa justificativa para o “descarregamento de lixo” por meio de atitudes ou de palavras ríspidas. Isso pode ser fruto de um sentimento de frustração, de doença ou de dor, de mal humor, de estresse, de falta de amor, enfim, de se estar em um dia de fúria. Todos esses motivos são plausíveis e certos. Acontece, desse jeito, comigo e com o outro.

Portanto, não aceitar o lixo de ninguém é mais profundo que agir com arrogância ou que se calar diante de grosserias, falta de polidez ou desrespeito. O que quero dizer com isso é que primeiro precisamos ampliar nosso ponto de vista quando olhamos para nossas atitudes justificadas. Não fazemos por mal, é claro, ninguém o faz. Nessa perspectiva, quando perdemos as estribeiras não somos grosseiros, mas estamos grosseiros por alguma razão. Às vezes até sabemos o porquê, mas, às vezes, nem mesmo nós conseguimos entender por que agimos desta ou daquela forma.

Com esse olhar fica mais fácil olhar as situações de conflito que nos colocam como coitados ou como algozes. E, a partir dessa visão, voltada não apenas para o acontecimento, mas para toda a rede que se constrói para que o momento desagradável aconteça, torna-se possível observar o agressor e deixá-lo com o seu lixo. Pela mesma razão que rejeito o lixo doméstico de outro na porta da minha casa. Aceitar o dejeto dos outros é nocivo à saúde mental e emocional.

Entretanto, para conseguir deixar cada um com o que é seu, faz-se necessário enxergar os insultos e a rudeza como componentes da natureza humana que só podem ser enfrentados com harmonia, esta, sim, a melhor arma, porém acessível somente àqueles que aceitam o desafio de se conhecerem e de serem melhores a cada dia.

E assim, aceitar sair da dicotomia vítima/agressor e ir para um lugar da consciência na qual somos apenas seres humanos. Uma vez neste espaço, podemos escolher vibrar em harmonia com tudo e com todos, apesar das opiniões diferentes e das contrariedades. Em outras palavras, estar em um estado no qual reciclamos nosso próprio lixo e ainda deixamos cada um com o que lhe pertence.

Ser a diferença que você deseja ver no mundo, isso sim é viver sem coitadisse.

(*) Carmen Hornick –por Literare Books International. Instagram:@carmen_hornick | e-mail: carmen_hornick@hotmail.com

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