“Nós não deveríamos desistir do Cerrado”, diz Ane Alencar na COP28

Diretora de ciência do IPAM faz coro à proteção do segundo maior bioma da América do Sul; desafios estão no desmatamento ilegal e CAR não validado

“As mudanças de uso da terra no Cerrado são o tópico mais importante no Brasil, eu diria, porque nós temos boas notícias sobre a Amazônia”, disse Ane Alencar, diretora de Ciência do IPAM (Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia) no side event “Emissões brasileiras: a caminho da COP30?” ocorrido nesta sexta-feira, 8, dentro da programação oficial da COP28, em Dubai.

Geógrafa, Alencar é uma das maiores especialistas brasileiras em fogo na Amazônia e no Cerrado. Os dados de emissões por bioma no país foram destaque em sua apresentação, bem como as particularidades que devem ser levadas em consideração para proteção dos ecossistemas.

O desmatamento é o principal fator que compõe mudanças do uso da terra no Brasil. Em 2023, caiu 40% na Amazônia, mas cresceu 3% no Cerrado. Considerando que o Cerrado é duas vezes menor que a Amazônia, a escala da área desmatada torna-se ainda maior. A savana brasileira, segundo maior bioma da América do Sul, tem pouco menos da metade de sua área ainda coberta por vegetação nativa.


A distribuição da terra no Cerrado – e a baixa proporção (11,2%) de áreas protegidas no bioma – faz com que a maior parte de sua vegetação nativa (62%) esteja dentro de propriedades privadas. O desmatamento no bioma se concentra em áreas registradas no CAR (Cadastro Ambiental Rural).


“Mais de 70% do bioma está dentro de áreas com CAR. Podem ser pessoas proprietárias, de fato, ou não. Isso precisa ser considerado em qualquer tipo de solução. Para diminuir o desmatamento no Cerrado, talvez as medidas que foram tomadas na Amazônia não sejam o suficiente”, afirmou a pesquisadora.

O Código Florestal permite que propriedades rurais no Cerrado desmatem uma parcela maior de sua área do que aquelas localizadas na região amazônica. Ainda assim, só 8% dos alertas de desmatamento no Cerrado tiveram autorização, conforme análise da rede MapBiomas Alerta, coordenada por Alencar.

“Nós não deveríamos desistir do Cerrado, mesmo entendendo que as pessoas têm o direito de desmatar. Mas nós precisamos saber se essas áreas de CAR são realmente propriedades privadas, ou se foram apropriadas. Também devemos investigar as autorizações de desmatamento. Ainda temos um longo caminho para percorrer nas melhorias de aplicação das políticas existentes para reduzir o desmatamento no Cerrado”, sugeriu a diretora.

Cerca de 48% das emissões anuais do Brasil vêm das mudanças do uso da terra, principalmente, do desmatamento. Na proporção dos biomas, 75% desses gases são emitidos na Amazônia e 14% no Cerrado. Os dados são do SEEG (Sistema de Estimativas de Emissões e Remoções de Gases do Efeito Estufa).


Alencar também comentou sobre as emissões na Amazônia: apesar da redução no desmatamento, a liberação de gases relacionados ao fogo ainda cresce no bioma.

“Nós reduzimos o desmatamento em comparação com os anos 1990 e começo dos 2000, mas as emissões por fogo aumentaram. As árvores que morrem queimadas continuam emitindo carbono por pelo menos 10 anos depois do episódio de fogo. Precisamos de mais pesquisa sobre isso, em outros países também”, avaliou.

O evento discutiu a trajetória das emissões brasileiras em três décadas e as perspectivas diante das metas climáticas atuais do Brasil, definidas na contribuição nacional dentro do Acordo de Paris.


Entre os compromissos assumidos pelo país está limitar as emissões anuais de 2025 a 1,3 bilhões de toneladas de gases do efeito estufa, e a 1,2 bilhões de toneladas em 2030. No ano passado, as emissões brasileiras foram de 2,3 bilhões de toneladas. Para alcançar os objetivos, o desmatamento na Amazônia deve cair ao patamar de 2009 a 2012, comentou no evento David Tsai, coordenador do SEEG.

Também participaram da mesa Luis Fernando Guedes, diretor da SOS Mata Atlântica; Brenda Brito, do Imazon (Instituto do Homem e Meio Ambiente da Amazônia); e Isabel Drigo, do Imaflora (Instituto de Manejo e Certificação Florestal e Agrícola). A mediação foi de Claudio Angelo, do Observatório do Clima.

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