O mercado de compensação de carbono pode chegar a US$1 trilhão com a legislação correta

Dúvidas sobre a qualidade do crédito e o impacto climático fizeram com que os investidores dessem uma pausa em 2022, mas a demanda a longo prazo pode impulsionar um crescimento gigantesco.

O valor total dos créditos de carbono produzidos e vendidos para ajudar empresas e indivíduos a cumprir suas metas de descarbonização pode atingir US$1 trilhão logo em 2037, segundo o novo relatório de pesquisa da BloombergNEF. No entanto, o chamado mercado voluntário de carbono — que permite a comercialização de créditos verificados de redução de emissões, cada um equivalente a 1ton de carbono — atualmente não está estruturado para o sucesso. Definições mais rigorosas de qualidade e uma maior ênfase na remoção de carbono podem aumentar a confiança do mercado, aumentar os preços e impulsionar a demanda.

Afetado por críticas da mídia e de investidores, o mercado de compensação não aumentou em 2022, segundo o Long-Term Carbon Offsets Outlook da BNEF. As empresas compraram apenas 155 milhões de compensações, uma queda de 4% em relação a 2021, devido a temores de risco à reputação na compra de créditos de baixa qualidade. A oferta destes créditos cresceu apenas 2%, com 255 milhões de compensações criadas por projetos em todo o mundo. A oferta de créditos de “desmatamento evitado” diminuiu em um terço de 2021 a 2022. Algumas empresas foram acusadas de greenwashing após comprarem compensações de projetos que tiveram um impacto ambiental questionável.

Kyle Harrison, chefe de pesquisa de sustentabilidade da BNEF, e o principal autor do relatório, foi altamente crítico em relação as normas atuais. “O mercado de compensações de hoje, criado principalmente a partir de transações bilaterais de créditos baratos, está potencialmente cavando sua própria cova”, disse. “Os compradores precisam de transparência, definições claras em torno da qualidade e fácil acesso ao fornecimento premium, ou os próximos anos serão parecidos com o que vimos em 2022. Essas mudanças gerarão sinais de demanda para os projetos de maior impacto de descarbonização e com maior necessidade de investimento.”

De olho em 2050, a BNEF modelou a oferta, a demanda e os preços de compensações de carbono em três cenários potenciais. Sob cada um, a demanda aumentaria, mas com margens substancialmente diferentes. Os preços também são drasticamente diferentes.

No primeiro, o voluntary market scenario (cenário de mercado voluntário, em português), as empresas poderiam comprar qualquer tipo de compensação de carbono para atingir suas metas de zero líquido e precisariam de 5,4 bilhões de compensações anuais em 2050. O mercado permaneceria constantemente com excesso de oferta e 8 bilhões de compensações seriam criadas anualmente em 2050, principalmente por evitar o desmatamento. Os preços aumentariam para apenas US$12/ton em 2030 e US$35/ton em 2050, permitindo que as empresas recorram à compensações baratas de valor ambiental duvidoso para alcançar suas metas de descarbonização. Neste cenário, o mercado seria avaliado em US$ 15 bilhões anuais em 2030 — acima das estimativas atuais de US$ 2 bilhões.

No removal scenario (cenário de remoção, em português), o saldo entre a oferta e demanda seria muito mais apertado, pois seriam consideradas apenas as compensações de projetos que realmente removeram carbono da atmosfera. Os créditos relacionados ao desmatamento evitado ou a projetos de energia limpa seriam desconsiderados. Neste cenário, haveria uma breve escassez de oferta no mercado a partir de 2037, pois a tecnologia de remoção de carbono, captura direta do ar (DAC), continua sendo cara para ser construída em grande escala. Os preços de compensação de carbono poderiam disparar acima de US$250/ton, e o mercado anual chegaria a quase US$ 1 trilhão.

Um mercado de compensação que permite apenas a remoção de carbono poderia direcionar o investimento para tecnologias como DAC, ajudando a reduzir custos. Tais preços altos também poderiam obrigar algumas empresas a investir em outras estratégias de descarbonização com maior impacto. No entanto, há uma preocupação de que essas compensações tão caras nos anos seguintes possam fazer com que a maioria das empresas opte por sair deste mercado. Isso poderia até levá-las a abandonar completamente suas metas de zero líquido, pois isto lhes custaria muito.

Imagem 1: preços de compensação de carbono nos cenários “voluntary market” e “removal”

Fonte: BloombergNEF. Observação: o gráfico mostra a previsão dos preços ao invés de preços reais.

A definição do que constitui uma compensação de carbono de alta qualidade é uma questão polêmica atualmente. Investidores, empresas e organizações sem fins lucrativos reconhecem cada vez mais que a definição de qualidade engloba fatores difíceis de quantificar, como permanência, adicionalidade e benefícios além da descarbonização. Um terceiro cenário na perspectiva da BNEF, o bifurcation scenario (cenário de bifurcação, em português), assume que este debate divide o mercado em dois. Um deles é um mercado menor e menos líquido para compensações de alta qualidade, incluindo remoção baseada em tecnologia e soluções baseadas na natureza na África, América do Norte e Oceania. A demanda por compensações de alta qualidade atinge apenas 433 milhões em 2030 e 1,3 bilhão em 2050, mas os compradores se deparam com um pool menor de oferta em relação a outros cenários do relatório, de 1,4 e 3,2 bilhões nos mesmos anos. Os preços alcançam a máxima de $38/ton em 2039 antes de cair para $32/ton em 2050.

Imagem 2: preços de compensação de carbono no cenário “bifurcation”

Fonte: BloombergNEF. Observação: o gráfico mostra a previsão dos preços ao invés de preços reais.

Neste cenário de bifurcação existe também um mercado maior para todas as compensações de baixa qualidade restantes, incluindo geração de energia e soluções baseadas na natureza na Ásia e América Latina. Os preços são mais altos incialmente devido à maior demanda de US$12/tonelada em 2025, mas só chegarão a US$22/tonelada em 2050. As empresas que se aproveitam deste mercado de baixa qualidade podem ter mais convicção de que suas compensações irão atingir suas metas de zero líquido, mas ao mesmo tempo podem ter que enfrentar um risco muito maior do que atualmente enfrentam em relação à sua reputação.

O resultado do cenário de bifurcação pode mudar dependendo do que compreende alta e baixa qualidade. Bolsas, produtos futuros, fornecedores de tecnologia e iniciativas privadas como o Integrity Council on Voluntary Carbon Markets estão trabalhando arduamente para padronizar e simplificar as compras de compensação, criando padrões de qualidade claros. Se esses esforços forem bem-sucedidos, as definições de normas e qualidade podem aumentar a liquidez no mercado e ajudar as empresas e os investidores a diferenciar suas estratégias de compensação. Porém, com tantos grupos lidando com esta questão de forma independente, os compradores podem ficar cada vez mais confusos.

“Criar normas padronizadas é o mais importante para a estratégia do mercado de compensação de carbono. Resolver essas questões pode aumentar o mercado em várias ordens de magnitude, mas há o risco de muitos desses esforços concorrentes acontecerem ao mesmo tempo, semelhante ao que vimos em áreas adjacentes, como em relatórios ESG e finanças sustentáveis”, disse Harrison. “Se continuarmos com esta abordage isolada, acabaremos de volta à estaca zero”.

A BNEF atualiza seus dados históricos de oferta e demanda de compensação mensalmente e sua perspectiva de longo prazo anualmente.

Fonte: BloombergNEF

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