Por que o marco temporal ameaça os povos indígenas brasileiros?

Na próxima sexta-feira (15), membros da rede Ashoka se reúnem para discutir os impactos do Marco Temporal sobre os direitos e as culturas indígenas. No centro da conversa, estarão a Deputada Federal Joênia Wapichana; a jornalista e co-fundadora da Amazônia Real, Kátia Brasil; e Ednei Arapiun, líder indígena juvenil na região do Tapajós e coordenador do Conselho Indígena Tapajós Arapiuns.

O artigo 231 da Constituição Federal Brasileira, promulgada em 1988, diz que “são reconhecidos aos índios sua organização social, costumes, línguas, crenças e tradições, e os direitos originários sobre as terras que tradicionalmente ocupam, competindo à União demarcá-las, proteger e fazer respeitar todos os seus bens”.

No ano de 2008, esse direito constitucional foi questionado por fazendeiros e políticos ruralistas contrários à homologação da demarcação contínua da Terra Indígena (TI) Raposa Serra do Sol, em Roraima, no norte do Brasil. Eles ingressaram com uma ação no Supremo Tribunal Federal (STF). Durante o julgamento da ação, o relator do processo, ministro Carlos Ayres Britto, atualmente aposentado, apresentou em seu voto a tese do marco temporal. Pelo seu entendimento, os indígenas teriam direitos originários sobre as terras que ocupassem no dia 5 de outubro de 1988 – que é a data da promulgação da Constituição Federal. A tese também previu salvaguardas para situações em que os indígenas não se encontrassem na área geográfica. Porém, na prática, teriam que se comprovar conflitos, violência, ameaças, coação ou usurpação da terra para desbancar o marco temporal.

No caso da TI Raposa Serra do Sol, a tese do marco temporal tampouco chegou a ser aplicada e, em 2009, o STF votou por unanimidade pela demarcação contínua da Terra Indígena, anulando posses do início do século XX, por exemplo.

Mas, a tese foi tomando grande dimensão ao tornar-se amplamente defendida por ruralistas e setores interessados na exploração de recursos localizados em terras indígenas. O atual Governo não demarcou um centímetro de terra indígena, como prometido na eleição presidencial de 2018, o que provocou o aumento de conflitos agrários e mortes de indígenas. Hoje, processos de demarcação de 310 terras indígenas estão paralisados e há centenas de conflitos envolvendo terras indígenas por todo o país que poderiam ser resolvidos se o marco temporal for rejeitado definitivamente.

A tese do marco temporal passou a ser usada em outros julgamentos, como no atual recurso que tramita no STF, que questiona a demarcação da Terra Indígena Ibirama-Laklãnõ, do povo Xokleng, do estado de Santa Catarina. O processo, que está parado desde o dia 15 de setembro, é movido por políticos e ruralistas.

No Brasil, existem 305 etnias indígenas que falam 274 línguas diferentes. A população é estimada em mais de 1 milhão de pessoas, mas o governo brasileiro reconhece apenas os povos que vivem em aldeias, cerca de 900 mil, ignorando as populações que moram nas periferias das cidades.

Organizações de direitos humanos e que defendem os povos indígenas brasileiros, como a Conectas, afirmam que a tese do marco temporal “é perversa porque legaliza e legitima as violências a que os povos foram submetidos até a promulgação da Constituição de 1988, em especial durante a Ditadura Militar. Além disso, ignora o fato de que, até 1988, os povos indígenas eram tutelados pelo Estado e não tinham autonomia para lutar, judicialmente, por seus direitos. Por tudo isso, os povos indígenas vêm dizendo, em manifestações e mobilizações: “Nossa história não começa em 1988!”.

Para saber mais sobre este importante desafio da democracia brasileira e ouvir depoimentos de quem é diretamente afetado pela decisão do STF, participe do encontro neste dia 15/10, às 11h (horário de Brasília). Acesse o zoom por este link .

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